Futebol Bloco Por Bloco

Por que não dividirmos os direitos de transmissão futebolística do jeito certo?

Esses dias eu estava vendo um vídeo do canal de Ubira Leal (o qual considero o maior geek em futebol no Brasil) intitulado "Como os Alemães Dividem os Direitos de TV? Um Formato que Poderia ser Usado no Brasil". E lembrei daquele post no blog Variante da proposta que elaborei de um novo calendário para o futebol brasileiro. E mexendo nos meus parafusos, cheguei a conclusão: tudo se encaixa! Uma coisa depende da outra. Vejam o lado bom que o recolhimento forçado pela pandemia da Covid-19 está proporcionando: o surgimento de novas (e boas) ideias.

O atual modelo de compra e venda dos direitos de transmissão dos campeonatos de futebol no Brasil transparece o quanto a nossa CBF é 100% escrava de um conglomerado de comunicação tão agressivo quanto influenciadora como o Grupo Globo e não tem a mínima chance em ter autonomia para ela própria colocar a venda suas competições. Eu postei um vídeo de um registro curioso e não menos interessante de uma nota lida no TJ Brasil de 1997 do interesse do SBT em adquirir o Campeonato Brasileiro de Futebol de 97, 98 e 99, oferecendo praticamente o dobro que o oligopólio Band/Globo tinham oferecido para renovar os compromissos até então findados no ano anterior.

Pois bem, havia uma cláusula controversa no contrato antigo que delegava "direito de preferência" aos últimos detentores para cobrir qualquer oferta da concorrência, isto é, gastar o que não tem para se perpetuar na transmissão dos jogos até Deus sabe quando.

Esse caso não atingiu somente a TV aberta. Os tentáculos Globais alcançaram também a TV por assinatura, enxotando pra escanteio a TVA/ESPN que tinha contrato de exclusividade do Brasileirão entre as TVs pagas até 2001, uma demonstração de que o Clube dos 13 exerce um poder tão grande quando da CBF, permitindo o SporTV a mostrar os jogos dos clubes integrantes da agremiação supracitada (os cachorros grandes), enquanto que a concorrente teve de se contentar com as raspas de tacho, só com os jogos dos times "menos importantes" da Série A. Mas foi só a partir do ano 2000 que Globo/SporTV domina geral no setor futebolístico e se é pra licenciar o sinal de transmissão com outra rede aberta, teria que exibir os mesmos jogos que a emissora-líder estivesse mostrando (com raras exceções). Ou seja, sem possibilidade de alternativa na TV aberta.

Mesmo com a TNT Sports (ex-Esporte Interativo) ter conseguido firmar acordos individuais com alguns clubes importantes em 2019 para transmitir um jogo aqui e ali na TV por assinatura em sinal aberto (diga-se de passagem), o fato não resolve o problema, pelo contrário, tapa o sol com a peneira e beneficia indiretamente o Grupo Globo na questão ibopística, tendo assim a exclusividade perene em mostrar os jogos dos times considerados "da maioria" como Flamengo, Corinthians, São Paulo e Grêmio.

É por isso que uma coisa puxa outra, uma mudança (ou adaptação, se vocês preferirem) no calendário do nosso futebol para permitir um novo formato de compra e venda dos direitos de transmissão das ditas "competições CBF" às emissoras de TV, sejam abertas ou pagas. Essa proposta que elaborei abaixo foi inspirada no modelo alemão já explorado no vídeo do Ubira Leal (que citei no primeiro parágrafo) e engloba os Campeonatos Brasileiros das Série A, B e C, a Copa do Brasil e a Supercopa do Brasil, com direito a algumas vantagens por pacote, cuja meta é mostrar ao vivo o maior número possível de jogos durante a temporada. Confiram:

1º Bloco - TVs Abertas Comerciais:
Pacote A - Simples
- Quartas, 21h30 (Toda a Copa do Brasil + Rodadas do meio-de-semana da Série A)
- Domingos, 17h00 (Dois turnos da Série A + Fase Final)
- Exclusividade da Supercopa do Brasil

Pacote B - Semana Livre
- Sábados, 16h15 (Dois turnos da Série B + Fase Final)
- Domingos, 17h00 (Dois turnos da Série A + Fase final)
- Eventualmente as rodadas do meio-de-semana da Série A
- Exclusividade dos Jogos de Repescagem entre as Séries A e B

Pacote C - Domingo Livre
- Quartas, 21h30 (Toda a Copa do Brasil + Exclusividade das rodadas do meio-de-semana da Série B)
- Sábados, 16h15 (Dois turnos da Série B + Fase Final)
- Exclusividade dos Jogos de Repescagem entre as Séries B e C
- Fase Final da Série C (Sábados, 21h30)

2º Bloco - TVs Abertas Públicas, Independentes e UHFs:
Pacote D - Série C Regionalizada
- Sábados, 18h30 e Domingos, 19h15 (Duas fases)
- Fase final facultativa (Sábados, 21h30)
- VT completo de um jogo da Série B aos sábados e de um jogo da Série A aos domingos

3º Bloco - TVs por Assinatura:
Pacote E - Premium
- Terças e/ou Quintas, 21h30 (Toda a Copa do Brasil + Rodadas do meio-de-semana das Séries A e B)
- Sábados, 16h15 (Dois turnos da Série B + Fase Final) e 18h30 (Duas fases da Série C + Fase final às 21h30)
- Domingos, 17h00 (Dois turnos da Série A + Fase final)
- Torneio da Morte da Série A
- Exclusividade de dois jogos da Seletiva da Sul-Americana
- Exclusividade dos Jogos de Repescagem entre as Séries A e B

Pacote F - Jogos Noturnos
- Terças e/ou Quintas, 21h30 (Toda a Copa do Brasil + Rodadas do meio-de-semana das Séries A e B)
- Sextas, 21h30 (Somente os dois turnos da Série B)
- Sábados, 18h30 (Somente os dois turnos da Série A)
- Domingos, 19h15 (Somente as duas fases da Série C)
- Torneio da Morte da Série B
- Exclusividade de dois jogos da Seletiva da Sul-Americana
- Exclusividade dos Jogos de Repescagem entre as Séries B e C

Pacote G - Rodadas Duplas
- Sábados, 16h15 (Dois turnos da Série B + Fase Final) e 18h30 (Duas fases da Série C)
- Domingos, 17h00 (Dois turnos da Série A + Fase final) e 19h15 (Duas fases da Série C)
- Fase Final da Série C (Sábados, 21h30)
- Exclusividade de dois jogos da Seletiva da Sul-Americana
- Torneio da Morte das Series A e B
- Exclusividade da Supercopa do Brasil

4º Bloco - Streaming e Pay-Per-View:
Pacote H - Nacionalização de algumas partidas
- Jogos regionalizados na TV aberta e TV por assinatura de todas as competições e em todos os horários disponíveis

Para refrescar a memória dos transeuntes de plantão que acessam o blog, vamos dar um breve resumo sobre como deveriam ser os sistemas de disputa das "competições CBF" para se adaptarem a esse novo formato de venda de direitos de transmissão por bloco:
  • Os Campeonatos Brasileiros das Séries A e B deveriam ter o mesmo regulamento: 20 clubes jogando entre si, mas ao invés de pontos corridos, a disputa seria separada em dois turnos, um por semestre;
  • O campeão de cada turno e os dois times com melhor índice técnico disputariam a fase final (um quadrangular) valendo o título e duas vagas para a fase de grupos da Libertadores (Série A) ou duas vagas para a primeira divisão (Série B), sem contar as outras duas vagas para a Pré-Libertadores (Série A) ou para a repescagem contra os dois primeiros do torneio da morte da divisão superior (Série B);
  • O lanterninha de cada turno e os dois times com os piores índices técnicos iriam para o torneio da morte, em que os dois últimos colocados seriam rebaixados de fato e os dois primeiros teriam vaga para uma repescagem contra os terceiro e quarto colocados da divisão inferior;
  • Para os 12 times que ficarem "no limbo" da Série A, isto é, entre a 5ª e a 16ª colocação na soma dos turnos disputariam uma seletiva para a Copa Sul-Americana, formando assim seis cruzamentos de confronto através de um sorteio (de acordo com o índice técnico de cada equipe) valendo uma vaga cada um [para a Série B, não pensei nada à respeito, de repente rola umas seletivas para a Copa do Brasil];
  • Já a Série C seria um pouco mais complexa, pois propus que o número de participantes dobrasse de 20 para 40. Esses 40 clubes seriam separados em 4 grupos de 10 cada um e nesta primeira fase (disputada no primeiro semestre) os times de cada grupo se enfrentariam em partidas de ida e volta;
  • Os dois últimos seriam imediatamente rebaixados e os quatro primeiros passariam para uma segunda fase (disputada no segundo semestre) onde seriam reagrupados em dois grupos de oito onde novamente jogariam entre si dentro de seus grupos em turno e returno;
  • Os dois primeiros colocados de cada uma dessas chaves iriam para a fase final (quadrangular) valendo o título, além de duas vagas para obter o acesso e outras duas vagas para a repescagem contra o campeão e vice do torneio da morte da Segundona.
Quanto as regras do televisionamento dos jogos para as emissoras que adquirirem um dos pacotes descritos acima, seriam estas:
  • As transmissões devem ser diferentes entre uma emissora e outra que compraram os pacotes que continham os mesmos dias e horários à disposição. Para cada emissora, seriam permitidos no máximo a exibição de três jogos por rodada, sendo um para toda a rede e outros dois regionalizados de acordo com os interesses locais;
  • Os jogos não podem ser exibidos em sinal aberto, tanto na TV aberta quanto na TV por assinatura, para a cidade onde a partida está sendo disputada até segunda ordem em caso de partida decisiva ou por questões de segurança;
  • Nas "competições CBF", estão vedados os negócios individuais/paralelos entre os clubes e as emissoras  de TV, bem como a compra de mais de um pacote do mesmo bloco, o que explica por si só que este modelo é extremamente democrático e estimula as TVs abertas a investirem em esporte como um dos grandes chamarizes de audiência e faturamento;
  • Os custos seriam definidos através de um acordo entre a CBF, os clubes e as emissoras. Evidente que os preços dos pacotes vão diferir um do outro dependendo do peso e do status, mas o suficiente para a CBF arrecadar uma bolada durante o quadriênio (o prazo de validade para as emissoras de TV firmarem tal compromisso).
Para se ter uma ideia, a federação de futebol da Alemanha arrecadou a bagatela de 4,4 bilhões de euros (ou R$ 27 bi na cotação do dia da postagem deste artigo) na venda dos direitos de transmissão para a TV de suas principais competições para as próximas quatro temporadas.

E isso deveria servir de modelo a outras modalidades esportivas coletivas (como vôlei, basquete e futsal, que junto com o futebol são as que mais atraem público e faturamento para as TVs) se querem ter seus eventos sendo melhor divulgados na TV aberta brasileira e assim conquistar não apenas espaço, mas um público cativo. Que as Superligas de Vôlei, a Liga Futsal e o Novo Basquete Brasil sigam este exemplo que estou propondo. Pois todo mundo tem a ganhar, é mudar para melhorar. Força de vontade, torcida brasileira!

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